sábado, 2 de agosto de 2014

Abriu os olhos e tentou focar o quarto quase completamente branco em sua volta, com exceção da parede em sua frente que tinha uma diversidade de traços, formas e cores. Desistiu de acostumar-se com a claridade que insistia em passar entre as cortinas fechadas e, tornando a fechar os olhos, procurou com as mãos pela cama os braços, pernas, boca, mãos de quem tem tornado os últimos dias, meses e anos melhores do que jamais sonhara em ter. Não encontrou mais nada além da coberta que a cobria. Estava só. No quarto, eram só ela, a coberta, suas roupas espalhadas pelo chão e as lembranças frescas da última noite.
Ainda tentando despertar, deixou-se repassar cada detalhe das últimas horas. Flashes de luzes brancas e coloridas. As músicas. Os sorrisos. Os corpos no mesmo ritmo. A sensação de ser tirada no chão e carregada pelos braços. Seu corpo contra a parede. Novamente no mesmo ritmo. Novos sorrisos. As respirações profundas e sincronizadas. O êxtase. O delírio. O silêncio da conversa dos olhos e mãos depois de um pouco de barulho. Sono interrompido somente por aqueles braços que a puxava para mais perto no meio da noite.
Tentou concentrar-se. Pegou o celular e no lugar de descobrir que horas eram, deu de cara com um post it colado e escrito com aquela letra conhecida: melhor olhar a última foto em que foi marcada. Sem acreditar, desgrudou o papel e se viu numa foto, na cama que estava, coberta apenas com um lençol branco fino, as costas à mostra e uma legenda "você estava tão linda dormindo que, depois de minutos te vendo dormir, simplesmente não consegui te acordar. Veste alguma coisa (haha) e desce que eu estou precisando de um beijo. Ps: não me mate pela foto. Ps2: não, eu não vou excluir".
Sim, o matarei, e, sim, vai excluir - pensou, mas com um sorriso enorme no rosto e os olhos já cheios de lágrimas.
Levantou, vestiu uma camiseta dele, prendeu o cabelo curto demais para ficar completamente preso, escovou os dentes e desceu. Abriu a porta e seu rosto era uma mistura de sorriso e lágrimas.
Parabéns! Vê se não esquece que eu te amo. E cada dia mais.
E, baixinho, no ouvido: você está linda.
Sua única resposta foram um beijo e um abraço demorado. Ela sabia que era ali que queria estar sempre.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Saudade

Mesmo que tentasse conter pelo menos um pouco, era visível no rosto dela a ânsia, o desejo, a pressa de tê-lo perto. Noites mal dormidas são pouco para explicar. Duas horas lhe pareceram uma eternidade para se esperar.
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Para entender a saudade, precisa-se entendê-los. Entender o vai e vem dos dois: uma vida inteira de meros flashes de recordações tornadas em afeto repentino (mesmo que não exatamente), quebrados por um ano de saudade, seguido por algumas semanas de sonhos realizados, mais duas semanas de saudade, uns três meses de rotina completa à dois, dois meses de incertezas e distâncias e, por fim, duas semanas que os uniu mais do que nunca.
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Cada passo que dava na direção dele parecia querer lhe arrancar à força um sorriso. Era a distância diminuindo, era a dor se esvaindo. Ela sentia ele por ali, sabia que ele estava a observando. Quando, enfim, se permitiu levantar a cabeça, pôde ver, inquestionavelmente a pessoa mais alta naquele canto com o sorriso mais bonito, fitando-a.
A falta era por inteiro; do que tiveram e do que não podem ter. Abraços, minutos inteiros no silêncio da troca de olhares, a rotina, a preguiça, os sorrisos bobos. Difícil descrever o que os fizera mais feliz; Uma tarde inteira como duas crianças num fliperama; Um dia passeando pelos lugares bonitos da cidade; Ou como dois adolescentes de bicicleta num parque. Quem sabe até as tardes e noites de filmes, as noites mal dormidas (ou bem dormidas um ou lado do outro), os jogos, os amigos juntos...
Tudo que sentia em relação à ele era devastador. A paixão, a dor, o medo, a saudade, a alegria, o amor, a admiração. Tudo era de forma exagerada. E, exageradamente, eles tinham um ao outro. Devastadoramente rápido, complicado e complexo.
Assim, cada simples dia para era absurdamente necessário. Cada gesto, cada detalhe que é despercebido por aqueles que tem o privilégio de estar junto, para ela era infinitamente encantador. Cada simples olhar, sorriso sem motivo, cada entrelaçar de dedos, pernas, cada toque, beijo, abraço...
Ela conseguia ver a sinceridade nos olhos dele. O cuidado em seu jeito de falar. O seu desejo naquele irresistível sorriso de canto de boca. O amava mais a cada conversa, a cada novo detalhe descoberto, a cada novo segredo deixado pra trás, a cada nova intimidade.
Surpreendeu-a como ninguém conseguiu, amou-a de volta. E ela, entre seus devaneios e delírios mais reis do que nunca, ouviu a música onde tudo começara.
A ausência ensinou-lhes a aproveitar a presença. O medo de perder tornou-se certeza de voltar. A dor por estar longe transformou-se em força pra continuar.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Devaneios reais

Difícil entender como tudo faz sentindo mesmo não fazendo. Para quem vê de longe, ou até mesmo de perto, parece complicado compreender quão repentino foi, assim como deve ser estranho perceber tamanhas dificuldades e ver que ainda seguimos. Só não é estranho para nós.
Estranho é ver-me novamente em frente do que eu tanto sinto falta, depois de alguns minutos (sem contar os dias) de ansiedade e à milhares de pés do chão. Essa sensação será sempre a mesma, quer eu esteja chegando ou somente esperando. A sensação é mesma. A espera é a mesma. Indescritivelmente aquele sorriso ao me ver vai sempre me tirar o ar, me deixar sem palavras. As primeiras horas serão sempre para os meus olhos se acostumarem e saciarem a saudade de poder vê-lo, assim, com todos os outros sentidos. Todos juntos. E depois dou vez a cada um dos outros. Cheiro. Toque. Gosto. Até que tudo em mim perceba que não é só mais uma madrugada vazia em que meus desejos e sonhos me enganam.
Os dias parecem sempre confusos, se embaralham, desfazem sua ordem cronológica e ainda assim tornam-se fáceis de guardar na memória. Como não dá para separar em dias, a cabeça (ou o coração, talvez) cuida de transformar em outras categorias.
Desde o início, cada lembrança parece incrível demais para ser desperdiçada e esquecida, mesmo não havendo sentido algum nelas. Como explicar os dedos entrelaçados de anos atrás, sem nenhuma palavra trocada? E como esquecer?
Cada nova ida e volta será única, mesmo nada mudando. Ainda que pareça muito tempo, tudo o que ainda temos será infinito em lembranças.


Então me abraça forte e diz mais uma vez que já estamos distantes de tudo. Temos nosso próprio tempo.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Reticências

Quando se trata de nós, tudo parece começar e terminar em reticências. Fica subentendido, e sem exatamente início e fim. E a parte escrita parece um entrelaçado de momentos sem ordem cronológica definida, tão entrelaçados como nossas pernas, braços e dedos. Tudo confuso e claro como um sonho bom, que de lembrar te faz sorrir. Como lembrar de todas as noites em que me esperava dormir e ficava minutos só me observando, sem saber que na verdade eu estava apenas de olhos fechados te sentindo do meu lado; todos os dias em que eramos você, o mar e eu; todas as noites mal dormidas, ou sequer dormidas; todas as guerras de travesseiro, as besteiras. Os suspiros. Os toques. Os beijos. Os abraços, desajeitados, apertados, dos que me faziam sair do chão, você me colocando nos braços. Nossos corpos - apesar de eu ser quase trinta centímetros menor - pareciam se encaixar perfeitamente, se completar, e acompanhar o mesmo ritmo. As lágrimas. As despedidas. Mas prefiro lembrar dos sorrisos, apesar daquelas gotas salgadas derramadas significarem tanto. Eu prefiro lembrar que tive tudo o que eu desejei por tanto tempo, que seu rosto e sua voz foram as primeiras coisas que vi e ouvi durante tantos dias. Prefiro não esquecer de como tenho sorte. Por tudo. Por cada segundo. Por você. Pelas reticências...